Sedimento fino

Sou argila,
sedimento fino em suspensão.
Toda intempérie me carrega.
Parte de mim é erosão.

domingo, 29 de dezembro de 2013

Sem título

Como posso ainda sentir um cheiro que está a duas horas de distância geográfica? Mesmo com exemplo de memória olfativa deveras poético, hoje não tem poesia.

domingo, 22 de dezembro de 2013

Hipossono

Demorei pra perceber
que insônia combina com saudade,
saudade até o pescoço
como água num recipiente.
Saudade que deita com a gente,
saudade horizontal.

Francamente, ando com um chapéu de chuva
como uma nuvem que uso,
carregada acima de mim,
neste universo nublado de hipossono
que, de noite, não me deixa dormir
com um temporal de saudade.

Insônia só é insônia
quando a gente tenta dormir
e não consegue,
enquanto a saudade passa o dia latente
e a noite acordada.

Saudade só é saudade
quando o tempo é indomável
e a insônia não é mais insônia,
pois não queremos mais dormir,
recebendo a saudade de olhos abertos.

quinta-feira, 19 de dezembro de 2013

Sem título

Eu sou o mar
e você um barquinho na areia.
Você querendo ou não
o mar já não te molha mais
nem te polvilha de sal.
Eu sou o oceano. Eu sou amor
e você os Himalaias
que erguem-se imponentes
no meio do continente,
enquanto um ralo se abre
no abismo mais profundo.

segunda-feira, 16 de dezembro de 2013

Sem título

Em plena euforia do néctar,
parei de bater as asas
depois de ter desafinado.
Desapego é só o amanhecer.
Numa circunstância como essa,
uma é a tomada da decisão
no meio da tempestade.
Outra, é depois que passa.
Então, calei-me. Eu, beija-flor,
depois da tempestade das flores.

sexta-feira, 13 de dezembro de 2013

Sem título

A violência e a opressão existem e são fenômenos naturais tanto quanto o carinho e a comunhão. Se são naturais, significa que fazem parte da natureza. E a observação e interpretação da dinâmica da natureza e do espaço, da forma como fazemos, é uma característica privilegiada que a espécie humana possui, graças à capacidade de processamento de dados do nosso cérebro, mais possante que nos outros animais. Da mesma maneira que o leão mata a cria de uma leoa para assim poder reproduzir com a mesma e perpetuar a sua genética; que chimpanzés machos lincham um forasteiro até a morte; nós, seres humanos, promovemos guerras e genocídios. Não vejo motivo para tanto espanto quanto a essa violência amplificada, afinal, quanto mais desenvolvido o cérebro, maior a capacidade de cometer violência, bem como maiores são as possibilidades de violência, seja física ou psicológica. Os seres humanos desenvolveram métodos avançados de violência, como torturas de todos os tipos, empalamentos, crucificações, apedrejamento, decapitação, esquartejamento, cremações em fogueiras, bullying, abandono, acúmulo de riquezas por parte de minorias, humilhações de todos os tipos, subtração do tempo de um indivíduo, escravização... Essa emaranhada rede de possibilidades é possível graças à maior potência do nosso cérebro, como já mencionado. Mas, da mesma forma que podemos realizar violência, opressão e crueldades diversas, temos um grande diferencial, que é o poder do raciocínio e da escolha, escolha de cometer ou não violência; pensar, analisar, refletir sobre as repercussões, as consequências; deixar de lado, um pouco, o instinto animal basal e fazer imperar o intelecto. Ah, humanidade, de homens e mulheres! Humanidade de heterossexuais, homossexuais, bissexuais, assexuados - isso já está muito complexo! Humanidade de tantas igrejas, tantas seitas. Monoteístas, politeístas, ateístas... Machismo, feminismo, achismo... Ó, humanidade, quando irá perceber o nível de iluminação que pode alcançar? Quando irá perceber que pode mais, que encontra-se no patamar da cretinagem, quando pode estar acima da média? Quando irá parar de segregar? Quando perceberá que, assim como pode violentar de tantas formas combinadas, pode também crescer através do amor e da comunhão, da partilha, da humildade? O amor também pode ser multiplicado.

quinta-feira, 12 de dezembro de 2013

Sem título

Da colisão com uma borboleta
saio capotando.
Apaziguar briga de tanajura
me rende olho roxo e dente na lona.
Se vou de badogue,
o calango vem de faca e tiro.
Cuidado. A natureza pode matar.
E eu, que queria apenas brincar.

segunda-feira, 9 de dezembro de 2013

Sem título

Das surpresas que a chuva traz,
gostei muito da última.
Era uma vez o calor da noite...
Que trouxe consigo o calor do corpo,
que levou duas pessoas
por duas camas, por dois quartos,
cama por cama, quarto por quarto,
até tudo dormir em palavras soníferas.
Até não se perceber o que a boca falava.
Na manhã a vontade de chuva - é chuva!
Então, a dança da chuva,
até que, de fato, chuva
e sorriso encharcado,
pois a chuva traz consigo o fogo do céu.
E tempero pra canela é água e sal.

quarta-feira, 4 de dezembro de 2013

Cores de pavão

Pavão não escolhe nascer,
nem ser.
Pavão é.

Pavão não escolhe perder,
não escolhe vencer.
Pavão é.

Pavão não escolhe cantar,
dançar.
Pavão é.

Pavão não é macho,
nem fêmea.
Pavão é pavão.

Pavão nem consciência tem,
pois não precisa.
Pois pavão é.

Sem título

Não é o outono um vilão.
As folhas simplesmente
não aguentam e despencam
após a euforia da primavera
e a severidade
do inverno e do verão.
Sim, todos verão
as folhas mortas
e acusarão o outono.

domingo, 1 de dezembro de 2013

Sem título

O caminho está traçado
não desde sempre,
mas, há algum tempo.
O livre arbítrio é a própria vida
e a teimosia de cada um.