Sedimento fino

Sou argila,
sedimento fino em suspensão.
Toda intempérie me carrega.
Parte de mim é erosão.

domingo, 28 de agosto de 2011

Te amo, que amadurece e cai

Água e nutrientes
alimentam minhas raízes.
Luz, do sol e da lua,
chuva e vento atuam em minha folhagem.
Passam estações,
Passa o tempo de viagem.
Sinto crescerem os frutos
e os vou adoçando,
cedendo para eles
parte do que me nutre.
E como crescem os frutos!
Dia após dia,
do verde ao rubro.
A polpa pesa e, para baixo, com gravidade exige...
...Te amo! Gravemente.
E servirá de alimento
para a próxima estação,
quando disperso no solo,
o meu amor
passará outra vez,
capturado pelas minhas raízes,
pelo meu tronco até meus cabelos.
Gerará frutos e, mais uma vez,
amadurecerá
e cairá em te amo.

Sem título

Hoje você vive a minha vida.
Aquela vida que eu vivia
quando só sabia te querer
e você não me queria.
Você sabia o que não queria
mesmo sem saber o que sentia.
Você não queria o que sentia
mesmo sem querer o que não entendia.

Ah, o que uma confusão,
uma dúvida,
ainda que sem sentido,
sem explicação
para uma mente dominada por cinzas,
cinzas pretas do certo de ontem,
que se desmancham e mancham os dedos...
Ah, o que uma dúvida pode fazer
com o destino do universo.

terça-feira, 23 de agosto de 2011

Sobre humanos e pombos

Orgulho-me de mim mesmo quando lembro de certas viagens de infância: Raciocínios e fantasias possíveis, já nessa fase do desenvolvimento de um indivíduo humano. O que quero dizer com isso pode ser melhor explicado através de um exemplo. Então, lá vai um pequeno relato, inclusive, contado e interpretado por um "eU", sobre um "Eu" de outrora.

Sempre fui muito indagador a respeito do que me desse na telha ser. Lembro de me perguntar o porquê dos pombos serem tão difíceis de capturar, embora sejam mais lentos em relação a pássaros mais leves e ágeis como os pardais e os colibris. Porém, em relação às galinhas, há uma vantagem: Os pombos voam. Mas, nem mesmo as galinhas são fáceis de capturar, mesmo tendo essas aves ossos tão cheios de tutano. E mais imoportante ainda, por quê capturar esses animais? Mas por quê?

Enfim... "Eu" não questionava algo, aparentemente tão sem sentido, em vão. "eU" busco explicação no comportamento humano para tentar responder os meus guris questionamentos. Penso que as crianças conseguem agir ainda mais institivamente cruas que os adultos, refletindo muito da essência da nossa espécie e muito da necessidade da mesma em reinar no mundo dos animais. Um reflexo nítido dessa necessidade de reinar é um grupo de crianças brincarem de tentar capturar pombos. Da bricadeira, saem até manifestações interessantes da nossa capacidade intelectual, como desenvolver métodos mirabolantes de captura com utilização de armadilhas improvisadas de acordo com o que se tivesse à mão. Muitas vezes (quase sempre), não possuíamos nada à mão. Nenhum recurso. Nenhuma logísica. Nem mesmo planejamento. Simplesmente corria-se atrás dos pombos na tentativa de alcançá-los e capturá-los com as próprias mãos. Lembro que alguém chegou, certa vez, com a brilhante idéia de embolar uma camisa ou um pedaço de pano qualquer e atirar sobre o pombo, capturando-o, como faz uma rede mágica concedida pelo Mestre dos Magos. Acho interessante a idéia de embolar a camisa, pois assim diminui-se a área de contato e o atrito, numa manobra onde a camisa, embolada, ganha velocidade até abrir como uma rede inteligente bem em cima do animal a ser capturado.

Mas, o que significa a tentativa de capturar um pombo? Era o que "Eu" me perguntava. Por que todas as crianças queriam tanto apanhar pombos? Tomando como base a minha mente guri, naquela época, "Eu" tinha a intenção de capturá-los -sim, eu também entrava na onda, não sou hipócrita- apenas pela emoção de capturar algo tão fugidio, apenas pelo desafio e, logo após a captura (que, por sinal, não recordo de ter presenciado, nem de ter realizado) soltá-los. Isso é o que "eU", hoje, explico, com meus anos e minhas palavras. E digo mais: É um bom reflexo da natureza humana de tentar dominar todo aquele indivíduo do mundo animal que tenha um atributo evolutivo que, de alguma forma, ofereça risco. O atributo evolutivo dos pombos é a capacidade de voar. E o risco que isso oferece, eu procuro acreditar que resida em algum lugar do nosso DNA.

Os pombos estão entre nós, como ratos alados. Às vezes, até esquecem que sabem voar. Ontem vi dois meninos tentando capturar um pombo que, ou esqueceu que sabe voar ou simplesmente encarou os meninos como "manda vir, nem preciso usar as mãos" -ou melhor, asas.

Esses seres, para mim, tornam evidente o limite da incapacidade do ser humano. Eles chegam tão próximos a nós, nos dão a ilusão de que podemos apanhá-los, quando, na verdade, são escorregadios feito quiabo. Acredito que essa ilusão é gerada pelo fato de observarmos outras aves, menores e menos desengonçadas, aparentando ter mais intimidade e destreza com o vôo.

Pois é, os pombos desenvolveram asas e capacidade de voar. Possuem uma anatomia com aerodinâmica favorável ao vôo. E nós, humanos, copiamos. Desenvolvemos foguetes, aviões, balões, pipas... Tem gente até que se atira de edifícios acreditando ser o Superman. Estamos sempre tentando fazer melhor que os pombos, como um lamento por não possuir asas.

domingo, 14 de agosto de 2011

Sem título

Por você, que recebe tão pouco
e acha que é tão muito.
Por você, que é humilde,
que não vê sacrifício no sacrifício.
Esquivo, desta vez, do egoísmo de meus poemas
e ofereço pão e água,
sinceridade e transparência,
alimento.
Você, que também me alimenta,
de fascínio e beleza,
me lembrou que valem a pena os riscos.
Você me enche de orgulho.

Sem título

Você, meu irmão, verá
como a vida é dinâmica.
Perceberá como somos tão mutantes.
Você verá (muitas coisas).
Será plural.
Então, apenas viva.

quinta-feira, 4 de agosto de 2011

Sem título

Eu sou um rio fluindo em você
-você-pedra- e sigo até o mar.
E eu deságuo, obviamente, em você-mar.
Mas você é todo o curso,
da nascente até a foz.
Curso sem cachoeira,
sem o beijo cascata em você-pedra.

O primeiro beijo cascata
do rio em pedra,
na verdade,
parece não ocorrer
-pela altura da cachoeira
ou porque a água evapora antes do toque.

Fui cascata em você pra quê?
Pra me enrolar?
Pra afluir mais rio e não te fluir?
Pra meandrar sem fim após a queda
-sem jamais desaguar?

Água vem das montanhas, das nascentes,
e eu-lago, logo cavo, cavo,
para não transbordar.
Difícil não transbordar.
Difícil não fluir.
Difícil ser lago.
Difícil ser rio.
Difícil.

Sem título

Preciso combinar palavras,
traduzir sentimentos,
viver você, viver nós dois,
sentir
para poder transformar.
Preciso do seu amor e do meu amor,
de nós enraizados e emaranhados...
Entrelaçados, nos perdendo em nós mesmos,
nos encontrando perdidos,
nos sentindo muito bem encontrados,
perdidamente,
nas duas verdades.

Sem título

Para que você veja
a beleza que vêem meus olhos: a tua beleza,
eu preciso ser preciso.
Dar asas aos sentimentos,
torná-los palavras.

Não posso te dar meus olhos,
mas posso te dar minha visão
-de diferentes ângulos, vejo beleza em todos.
Posso cantar tua beleza em meus poemas...
Eu preciso ser preciso.


Ao longo do que chamamos de tempo,
infinitamente,
ao longo da existência,
da presença,
dos efeitos em minha mente,
em meus olhos... Você se manifesta.

E o resultado disso é lindo,
uma lei e um juramento.
Lei orgânica do meu organismo
e, se não compartilho, morre comigo,
sem efeito no universo,
sem função.

Descompasso

Nossos tempos.

segunda-feira, 1 de agosto de 2011

Chamado à minha terra

Me sinto como se devesse
cantar à minha terra.
Cantar como se canta às plantas,
com luz, água e minerais.
A terra só chama quando se está disposto a ir.
Hoje a minha terra me chamou
para que eu possa cantá-la.
Ainda cantarei a minha terra:
Rios de saudades caudalosas;
Corredeiras de ânsias a desabar em cataratas;
Cachoeiras de vida.
Assim cantarei, desaguando, mas em continente.
Afluente da minha terra,
alimentando raízes, galhos e folhas.
Serei polpa.
Fruto e sementes.
E minha poesia, nutrientes.