Sedimento fino

Sou argila,
sedimento fino em suspensão.
Toda intempérie me carrega.
Parte de mim é erosão.

segunda-feira, 27 de setembro de 2010

Sem título

É preciso tempo.
Mais tempo para que me conheça.
Aviso que a mata aqui é densa
e que é necessário um facão.
E talvez eu apareça
da neblina.
Dentre as coníferas ornamentadas
sou o cajueiro dos galhos retorcidos,
espalhado pelo chão.
E de tudo o que pode um corpo oferecer
sou mais coração.

quarta-feira, 22 de setembro de 2010

Fora um delírio

Olho pro céu e lembro da longa espera.
Lembro da minha certeza, tão estranha certeza
que, assim como as palavras, não sei de onde vinha.
Tão fina certeza, tecida em fio aracnídeo.
Tão fina certeza, grande e terrível interrogação,
combustível da esperança.
Por onde anda a lucidez
de quem recorre a um risco noturno no céu?
Por onde anda o chão
para os pés de quem deposita sonhos no céu?
Por onde anda o mar
que não reflete o céu?
Olhando para esse céu vejo a interrogação da cauda do escorpião,
que faz-me lembrar do combustível da esperança,
que é fio tão aracnídeo quanto a estranha certeza.
É corda bamba enrolada no espaço meado.
Hoje, num universo paralelo, olho para um céu concorrente,
onde a espera cessou-se,
a certeza confirmou-se,
a interrogação metamorfizou-se,
a lucidez anda cada vez mais perdida
ao passo de estar cada vez mais presente,
os pés plantam-se no chão, seguros,
o mar reflete o céu e cada variação de suas cores.
Fora um delírio.

sexta-feira, 17 de setembro de 2010

Sem título

Ca-mi-la,
mi-le-va,
mi-la-ça.
Que-me-cai-ba-a-su-a-pes-so-a.
Que-me-tre-pe-a-su-a-he-ra.
Ca-mi-la,
mi-le-va,
mi-la-ça.
Lá-me-cha-mou-e-nem-sa-be.
Lâ-mi-na-de-fu-ma-ça...

Sem título

De repente,
no repouso do olhar,
manso, distraído,
eis que surge aquela que o ergue
e o mirar retraído.

segunda-feira, 6 de setembro de 2010

Pós-Guerra

Estou a olhar,
de longe,
a minha cidade arrasada.
Aqui no alto,
nos morros,
o vento sopra o meu rosto.
Não ouço nada.
Apenas vejo, sereno,
os meus cadáveres
empilhados
por toda a cidadela.
Os muros e os portões
destroçados.
Não restara pedra sobre pedra.
Mas estou aqui,
surdo,
mudo,
sereno,
nos morros do meu reino.
E meus cadáveres,
hei de queimar.
A cidadela,
abandonar.
Os destroços...
O tempo dirá
que tudo passa
mesmo sendo de pedra.
E enquanto passa,
eu caminho
e espalho pelo caminho
sinais de futuras guerras.

domingo, 5 de setembro de 2010

Monazita

Você é rara.
Um fôlego onde não há ar.
Rara,
feita do que enche meus pulmões.
Rarefeita é a humanidade,
às alturas:
Altas altitudes,
poucas atitudes,
raras virtudes.

Aqui,
perto dessa praia monazítica,
onde me falta o ar,
jazem
idas e vindas pelo mundo.

Aí, onde se concentra monazita,
jazida de amor,
reina um ser maravilhoso
que é você,
que sopra os meus pulmões.

sexta-feira, 3 de setembro de 2010

Sem título

Eu luto contra algo
que não há quem possa.
Tento manter-me erguido,
rijo,
fincado ao substrato
feito braquiópodo.
Pedúnculo pende, balança.
E a tempestade me leva,
me varre, me carrega,
me arrasta
da face da Terra.
Me levanto todos os dias.
Todos os dias sou dizimado.
Quando vou entender a vontade maior?

Sem título

Um dia resolvi me organizar, parar de escrever na mão, na porta do guarda-roupa, em folhas soltas, de trás pra frente, digitar em "rascunhos" no celular... Acabei descobrindo que muita coisa se perdeu. Ontem encontrei algo que escrevi há mais ou menos 3 anos. Diz respeito a pureza de modo geral, a realidades distintas e paralelas, pontos de vista.


O puro nas pessoas,
a pureza na mente.
Filosofia do inocente
no mundo se faz presente
numa corda bamba.

O puro em terra firme:
Componente do universo.
A pureza, duvidosa,
se esconde em cada verso:
Contra capa da mente.

Verso do orgânico,
do psíquico do ser consciente,
que dita o puro anacrônico
[que acha que o mundo da frente
é diferente da gente inocente que ficou]
e não mais olha para trás.


Como um câncer, o homem, que há muito tempo vem sendo assim rotulado, destrói cada célula de pureza existente no organismo da Mãe-Terra.

[Cego com objetivos de "bem-estar-acomodado", visando evolução, avanço, progresso, tendendo cada vez mais ao individualismo.
O homem é orgulhoso, tem vergonha de olhar para trás. Olhar para um tempo em que a pureza era comum e se fazia presente nas mentes das pessoas.
O homem poda, reprime e oprime quem se atreve a pensar como no tempo em que chegou.
E quem se atreve a ser e ter consciência de que é puro? Ser, todos o são. Ter consciência é uma novidade nos tempos atuais. É um dom de poucos.]

No entanto, cada célula de pureza sempre será pura.

quarta-feira, 1 de setembro de 2010

Sem título

Você definha assim desse jeito.
Esse teu estilo
só te faz envelhecer
mas não te traz rugas
e nem amanhecer.
-Por que não respira fundo?
-Enche teu peito!
Com ares de renovação.
Pois nunca é tarde pra rever.
Como se faz alguém feliz?
Sendo,
sem deixar de ser?

(Algum lugar em 2006)